domingo, 19 de julho de 2009

As histórias do Coringa e suas relações com os filmes do Batman


Em alguns casos, os vilões são tão importantes quanto os heróis. É possível pensar no Superman sem Lex Luthor? Nem em Batman sem o Coringa. O personagem, que faz valer a definição de arquiinimigo, é a figura central de dois especiais que a editora Panini coloca em bancas, livrarias e comic shops: uma nova edição do clássico “Batman: A Piada Mortal”, de Alan Moore e Brian Bolland, e o inédito “Coringa”, de Brian Azarello e Lee Bermejo.

Curiosamente, os dois trabalhos mantém relações com as encarnações mais famosas de Coringa no cinema, de Jack Nicholson, no filme de 1989 (“Batman”); e do saudoso Heath Ledger, em “Batman: O Cavaleiro das Trevas” (2008). Lidos em conjunto, também ajudam a entender a mudança que se operou na relação cinema/quadrinhos.

Moore/ Bolland

A primeira edição de “A Piada Mortal” chegou ao mercado americano em março de 1988. Nela, a editora DC Comics voltava a apostar numa interpretação mais adulta do universo de Batman. “O Cavaleiro das Trevas”, minissérie em três edições de Frank Miller, havia sido um sucesso. Para não manchar o novo currículo do herói, a editora recorreu aos ingleses Alan Moore e Brian Bolland. O resultado foi uma história atípica: por um lado, Moore revisitava a mitologia de Batman (na qual, o Coringa é uma figura essencial), ao mesmo tempo em que introduzia elementos de crueldade e violência incomum no gênero dos heróis.

Moore começa a história com uma fuga banal de Coringa do Asilo Arkham. No entanto, o plano “maligno” do palhaço do crime é provar a tese de que o que separa os loucos dos sãos pode ser apenas um dia ruim. O método usado pelo inesperado filósofo são torturas físicas e psicológicas contra dois aliados do homem-morcego, o Comissário Gordon e sua filha Bárbara, a Batgirl.

Uma marca da quadrinização da graphic novel é o recurso à metamorfose dos quadros (quando o quadro seguinte repete elementos do anterior). Ora o efeito desejado é uma elipse, de tempo e espaço, ora a ironia maniqueísta. Por meio dessa arte precisa e limpa de Brian Bolland, Moore conta uma possível origem do Coringa, ligando-o irremediavelmente a Batman. O cineasta Tim Burton, um dos fãs da história, levou a conexão para seu primeiro longa do homem-morcego, no qual Jack Nicholson viveu o vilão, numa interpretação entre o caricatural das HQ e um sadismo contemporâneo.

Azzarello/ Bermejo

Lançado ano passado nos EUA, o especial “Coringa” inverte a ordem em sua relação com o cinema. A parceria Moore/ Bolland contribuiu para o filme de Burton; aqui, foi o filme de Chris Nolan que deu as coordenadas para os quadrinistas.

Não é correto falar em uma influência direta, já que filme e HQ foram lançados na mesma época. No entanto, supõem-se que a editora tenha “solicitado” algumas características no quadrinho. O Coringa desenhado por Lee Bermejo tem as mesmas cicatrizes na boca que Heath Ledger, no filme “Batman: O Cavaleiro das Trevas”. Nos dois casos, o Coringa também é menos palhaço e mais psicótico.

“Coringa” é o sintoma de um novo tempo das HQs, o das grandes adaptações do cinema. O que nos faz pensar se tais crias da indústria cultural podem mesmo ser comparados aos mitos. O trabalho de Azzarello é ótimo (ele já demonstrou ser cheio de boas idéias na autoral “100 Balas”), mas as vezes a coisa fica tão sombria que nem parece Batman.

Quando li “Coringa”, uma pergunta ficou martelando em minha cabeça: o que sobra do “mito” do Coringa nesta HQ? De fato, o tom realista parece expulsar a fantasia de Gotham City. Apesar de sombrio, o universo de Batman não carece dela. No entanto, Azarello recupera algo que estava na origem do personagem: a violência. Moore não abdicou dela em sua versão do embate Batman/ Coringa, mas deu menos destaque do que Azzarello.

Na edição de luxo da Panini para “A Piada Mortal”, a primeira aparição do palhaço do crime vem como material bônus. É uma história de 1940, assinada por Bob Kane (criador de Batman), no qual o personagem comete uma série de crimes em Gotham City. Mesmo se destinando ao público infantil, os produtores da HQ não economizaram na violência. Coringa rouba, invade casas, mata três por envenenamento e, ensandecido, luta com Batman, gritando que vai matá-lo.

Em germe, se nota o vilão como uma força, uma violência cega e destruidora. Não é difícil que Heath Ledger tenha ido fundo nas raízes e ressuscitado este primeiro e caótico Coringa. Uma pista desta relação é o artifício, que um usa no filme e outro no gibi, de se disfarçarem de policial para cometer mais uma das suas.

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